
A primeira começou em 2012 com o processo tecnológico e a produção de plantas piloto de fertilizantes, comercializados principalmente no mercado interno.
Em 2016, começou a segunda fase e implica a construção das plantas industriais de cloreto de potássio e carbonato de lítio para exportação, com piscinas industriais que garantem a matéria-prima necessária para obter sais básicos.
A terceira fase é a fabricação de baterias de lítio em escala industrial, em aliança com a empresa alemã ACI Systems para sua comercialização.
Nos próximos cinco anos, a nação andino amazônica pretendia produzir mais de 150 mil toneladas de sais de lítio com essas plantas, mas não tem sido fácil, quando a menos de uma semana das eleições gerais de 20 de outubro passado se converteu em polêmica.
Grupos minoritários do Comitê Cívico de Potosí (Comcipo) tentaram politizar o tema, considerado de importância vital para o desenvolvimento econômico da região, através de acordos com partidos políticos de direita para defenderem seus interesses.
Durante várias semanas, mantiveram uma greve por tempo indefinido para reivindicar maiores royalties pela industrialização do lítio e a modificação do Decreto 3738, mediante o qual se criou a empresa mista YLB ACISA com a participação da alemã ACI Systems.
Esse cenário foi propício também para manifestações contra o então binômio pelo Movimento Ao Socialismo (MAS), Evo Morales-Álvaro García Linera.
Em resposta às reinvindicações do Comcipo, autoridades e o próprio presidente Morales dialogaram com os manifestantes que, apesra da vontade do governo, tinham interesses muito diferentes aos do povo boliviano com o assessoramento do economista Juan Carlos Zuleta, participante ativo na Comissão Nacional do Lítio do Chile desde 2014.
Depois do golpe de Estado contra o líder aymara em 10 de novembro passado, a figura de Zuleta se tornou mais notória ao se converter no gerente executivo da empresa estatal Yacimientos de Litio Bolivianos (YLB), indicado pela autoproclamada presidenta Jeanine Áñez.
DESLEGITIMAR A INDUSTRIALIZAÇO DO LÍTIO, ESFORÇO DO REGIME GOLPISTA
Com a designação de Zuleta como gerente executivo da YLB, a industrialização do lítio na Bolívia se converteu em outra das bandeiras levantadas pelo regime golpista para, segundo analistas, desacreditar e desmoralizar o governo de Evo Morales.
A publicação boliviana Primera Linea, dias antes das eleições gerais de outubro, denunciou que o economista era íntimo colega de Samuel Doria, aliado do então candidato à presidência pela Comunidade Cidadã, Carlos Mesa, desde os tempos em que estudavam Economia na Universidade Católica da Bolívia.
Também o qualificou de agente que trabalha para o governo chileno em seus planos de boicotar esta esfera do desenvolvimento boliviano e de atuar sob as instruções de Saúl Lara, ex-ministro do governo quando Mesa era presidente (2003-2005).
No entanto, a nomeação de Zuleta em janeiro não desapercebida em território potosino quando mais de uma dezena de pessoas desconheceram essa decisão do governo de facto.
Um vídeo publicado na rede social Twitter mostra como, depois da chegada do especialista em temas de lítio ao município de Uyuni, os moradores da região o interceptaram e recusaram sua presença. A Federação Regional de Trabalhadores Camponeses do Altiplano Sul (Frutcas) realizou um pronunciamento oficial e se declarou em estado de emergência com o argumento de que os recursos naturais são para Bolívia e os royalties do lítio para Uyuni.
‘Desconhecemos e recusamos de forma categórica a designação de Juan Carlos Zuleta como gerente executivo da empresa estatal YLB, por ser um agente pró-chileno e principal inimigo da industrialização do lítio 100% estatal’, enfatizou o documento.
O ex-presidente Evo Morales, exilado na Argentina, na mesma rede social também denunciou a designação de Zuleta e afirmou que os golpistas negam a soberania energética do país.
‘O governo de facto nomeou Juan Carlos Zuleta, gerente da Yacimientos de Litio Bolivianos. O povo de Uyuni recusa o assessor de Camacho e Pumari. Os golpistas e neoliberais não querem a soberania energética da Bolívia, preferem inviabilizar a indústria do lítio’, publicou o líder aymara.
Com Zuleta à frente da YLB, se materializariam as denúncias feitas anteriormente por deputados do MAS de recogação do decreto supremo que estabeleceu a sociedade mista entre a Alemanha e a Bolívia, que garantiria por 70 anos o mercado das baterias de lítio.
Em um artigo publicado na Agência de Notícias Fides em 4 de setembro de 2018 titulado ‘Um péssimo projeto de industrialização do lítio na Bolívia’, Zuleta expôs suas dúvidas sobre a capacidade do governo de Morales para desenhar um plano de desenvolvimento do recurso natural.
O candidato à presidência pelo MAS, Luis Arce Catacora, em entrevista ao jornal argentino Página 12 no começo de fevereiro disse que o governo de facto está desfazendo os acordos feitos sob a presidência de Evo Morales.
‘Tínhamos avançado um contrato com uma empresa para fazer bicarbonato de lítio e baterias de lítio com um mercado garantido no exterior, que se eliminou’, denunciou o ex-ministro.
Arce confirmou que as autoridades golpistas pretendem executar projetos com outras empresas que, em sua opinião, não estranharia que sejam dos Estados Unidos, além de renegociar os contratos de venda de gás natural com o Brasil por 12 ou 15 anos que ‘jamais deveriam ser realizados’.
‘É um assunto onde o governo que se diz de transição não deveria fazer nada até que haja outro que o substitua pelo voto popular em 3 de maio e tome as decisões com total legitimidade sobre este recurso natural’, acentuou.
Assim mesmo, questionou as medidas nesses temas tomadas pelas autoridades golpistas pelas quais ninguém votou, quando só deviam se limitar a realizar um cronograma eleitoral.
A industrialização do lítio, sua comercialização em todo o mundo e os acordos com a Alemanha, a Rússia e a Índia foram iniciativas implementadas pelo ex-presidente Evo Morales para beneficiar o povo boliviano que, durante 14 anos, foi dono de seus recursos naturais.
Depois do golpe de Estado contra Morales, o cenário no país sul-americano mudou e personagens como Zuleta, apoiados pelo regime golpista, buscarão enriquecer uma minoria e as grandes multinacionais que até 2005 extraíram suas riquezas sem se importar com as necessidades da população.
O ex-vice-presidente Álvaro García Linera, a princípios de 2019, calculou lucros entre dois 5 2,5 bilhões de dólares anuais pela industrialização do lítio, e afirmou que era um sonho que se tornou realidade.
‘Isto vai revolucionar o mundo científico boliviano, vai revolucionar a indústria boliviana, a renda da Bolívia, este não é um sonho, já começamos’, argumentou.
Com o golpe de Estado, essa realidade se deteve e com ela começou o retrocesso à etapa neoliberal para os bolivianos.